segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

À lembrança de um parnasiano


Em 28 de dezembro de 1918, há exatamente 97 anos, partia para o templo das musas, o poeta, entusiasta nacionalista, cronista, amante das letras: Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac. 

Sentado em uma poltrona de sofá, já próximo de sua hora agonizante, pede aos presentes: "deem-me café, papel e pena... eu vou escrever...". Mas a letra e coração do poeta foram silenciados naquele instante. Deixa, nesse momento, um grande legado, dentre eles, a fundação de Academia Brasileira de Letras, na qual ocupou a cadeira dedicada ao poeta Gonçalves Dias. Além de deixar-nos sua vasta obra jornalística, literária e didática. Mas também deixa o amor de sua vida, Amélia de Oliveira, a noiva que nunca lhe abandonou, embora não fossem casados. Um amor complicado pelo patriarcalismo.
Após a morte do pai da moça, que consentia o enlace entre a jovem e o poeta, o irmão dela toma o lugar do pai e impede o casamento por considerar Olavo um homem boêmio, por seus poemas, sua veia dionisíaca. Nesse tempo, passa dias e noites fazendo cartas para a sua amada. Muitas são respondidas com breves frases. Não podendo ter a presença de Amélia em seus braços, dorme com as cartas - a certeza do amor correspondido nas letras. Após a morte do poeta, Amélia usa até o fim de sua vida um anel de esmalte preto com as inciais O.B. e todos os dias, interruptamente, visita o túmulo do amado de seu coração. Um amor eternizado nos poemas. 
Conhecido pelo cultismo da forma poética, Bilac é consagrado na literatura brasileira como o príncipe dos poetas. Título conferido por uma revista chamada Fon-fon, em 1907. Conferencista de grande eloquência, arrebatava a plateia com sua oratória. A única biografia que li sobre ele de autoria de Fernando Jorge, "Vida e poesia de Olavo Bilac", relata que em algumas dessas palestras, sempre sobre assuntos literários ou nacionalistas, pessoas lhe dirigiam louvores. Em determinada vez, uma jovem beijou a sua mão e outra inclinou-se a seus pés, por uma conferência, segundo o biógrafo, arrebatadora sobre a obra de Shakespeare. Talvez por esse ar infante, dentre outras coisas, ele deve ter sido considerado príncipe. 
Quem dera eu ser um escritor do cacife do meu xará. Só tenho a agradecer a meu pai por ter desistido de última hora de me registrar como Felipe. Saindo do cartório, o menino recém nascido, chama-se Olavo. Nome que me marcou em muita coisa, me identifico em muito com o poeta. Desde criança me chamam de Bilac. Espero que esse vocativo me torne igual ao meu xará ou, quem sabe, chegue perto. 
Seja na prosa ou na poesia é um autor que precisamos sempre retornar a ler, pois fornece um material canônico de grande valia literária. E as histórias da literatura brasileira não me deixam mentir. Até onde pude pesquisar todas o citam. O parnasiano pode estar fora de moda, mas é imortal. 
Na imagem, deixo um trecho de sua crônica "Ressurreição".

domingo, 27 de dezembro de 2015

O silêncio da escrita


Sim, foi por meio disso que tudo começou. Esta cálida hóstia de nossas mãos, cuja imaginação bélica destrona e eleva um cálice na criação. Sim, foi a culpada. Não nos julgue pelo que não podemos ver, pelo que não podemos sentir, pelo que não podemos prever. Nós temos a fé viva, não cremos no ignoto Deus. Tudo isso é tradução, é traição. Na passagem entre a linha e a espada, curvam-se as infantas diante de sua nobreza. Toda adornada no carmim e por baixo da pele, a lua. Sete fadas, sete presentes, sete reinos, sete selos. A cegueira é branca, o voto é branco, calam-se. Sileo e Tielo, quais dos dois Lacan preveniu? Quem é o fingidor que finge tão completamente um para tão longo amor, tão curta a vida? Que tem sangue eterno e asa ritmada, é desdobrável, eu sou? Olha para o céu azul, levanta a mãozinha, quer tocar o céu, tem e não o tem na mão. A festa acabou, o povo sumiu, a noite esfriou, na parte que me cabe neste latifúndio, irmão das almas, porque tinha uma pedra no meio do caminho. Hoje, uma lua morta, na rua torta, na tua porta. Amanhã vai ser outro dia, vai passar, tudo no mundo passa. Ah, estes olhos postos, em mim, de cigana oblíqua e dissimulada, sedutora madame, do cabelo mais preto que a asa da graúna. Podem voar mundos, morrer astros, sobre as ondas no mar de Vigo. De tudo ao meu amor serei atento, um João Evangelista com um pássaro misterioso, porque tudo vale a pena se alma não é pequena, para viver um grande amor. Só em Parságada tem de tudo, e lá acharei a estrela da manhã, seja no mar salgado, ó pescador da barca bela. Famigerado, os que leem o que escrevem, na dor lida sentem bem, igual a uma noite de sono na cama de seu Tomás da Bolandeira, uma felicidade clandestina. Silêncio e solidão, eu Severino, de tantas Marias, um eu sou.